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sábado, 17 de maio de 2014

Ninguém é inocente! - Wainer 2

[Ele (Getúlio Vargas) andava de um lado para o outro. De repente, parou e me disse sete palavras que seriam a senha para abrir-me as portas da grande aventura: - Por que tu não abres um jornal?]

[livro Razão da Minha Vida, 1987, pg 127]

Alguns anos mais tarde, durante uma sessão da comissão parlamentar de inquérito que procurou fazer uma devassa da "Última Hora" - e que promoveu a mais cruel e total l vestigação da trajetória pessoal e porfissional de um jornalista brasileiro em todos os tempos -, fui submetido a centenas de perguntas. Dezenas delas tentaram levar-me à confissão de que algum dia Getúlio me pedira para fazer um jornal. Meus inquisidores perseguiram permanentemente uma resposta que confirmasse essa versão. Não conseguiram. Revelo só agora. Na pergunta formulada por Getúlio naquela noite em Petrópolis, havia, evidentemente, um pedido:

- Por que tu não fazes um jornal?

Respondi que era o sonho de um repo´rter com o meu passado. Ponderei que não seria difícil articular a montagem de uma publicação que defendesse o pensamento de um presidente que, como era o seu caso, tinha um perfil de um autêntico líder popular.

- Então faça - determinou Getúlio.

Perguntei-lhe se queria saber como faria.

- Não - cortou. - Troqe ideias com Alzira e faça rápido. Reagi com o otimimo de sempre:

- Em 45 dias dou um jornal ao senhor.
- Então, boa noite, Profeta - encerrou getúlio.
- Boa noite, presidente.

A Última Hora começava a nascer, e eu a encontrar a minha razão de viver.

Alzira vargas já mantinha comigo, àlquela altura, uma relação de amizade total, absoluta. Tratava-se de uma pessoa excepcional. Alzirinha foi a mais extraordinária mulher do Brasil moderno, sobretudo pela influência que exerceu sobre Getúlio sempre em favor de posições nacionais e populares. Não seria difícil entender-me com ela em torno de ideias de criar um jornal pró-Getúlio. Antes de conversarmos, porém, decidi fazer algumas sondagens. Eu precisava de algumas informações sobre o mundo cujas fornteiras iríamos atravessar.

[´Obtidos os 30.000 cruzeiros, fechei o negócio com o Diário Carioca. Eu já tinha uma oficina, mas ainda me faltavam recursos para fazer um jornal.']

Poucos dias depois de iniciar minhas sondagens, encontrei-me casualmente na avenida Rio Branco, numa manhã de março de 1951, com o diplomata José Jobim. Éramos amigos. Ele convidou-me para almoçar n Jockey  Clube, e durante a conversa contei-lhe que estava á procura de uma oficina para imprimir meu jornal.

- Caiu a sopa no mel - comentou Jobim.

Informou-me, então, que não achava difícil fechar um acordo com o Diário Carioca, um jornal que, embora tivesse bastante prestígio junto ao restane da imprensa, atravessava uma fase  de fortes dificuldades financeiras. Jobim era muito ligado ao grupo que fazia o Diário Carioca - o redator-chefe, por sinal, era seu irmão, o jornalista Dantm Jobim. O dono era José Eduardo macedo de Soares, que pertencia a uma família de perfil aristocrático e recebia o tratamento de "senador" entre o pessoal da redação. Escrevia bem, assinava editoriais demolidores na primeira página. Abaixo de José Eduardo, na hierarquia do Diário carioca, estava Horácio de carvalho, um jovem de uma antia família fluminense, que mais tarde se tornaria riquíssimo. A equipe de redação era comandada por Pompeu de Souza e danton Jobim, e dela faziam parte jornalistas importantes, como Prudente de Morais, neto.

Embora vivesse em situação pré-famimentar, o Diário carioca conseguira recursos, durante o Estado Novo, para construir um prédio próprio com quatro andares, na avenida Presidente vargas. Para comandar a cosntrução do prédio, macedo Soares contratou Redig de campos, o arquiteto do Vaticano. A sede do Diário carioca tinha requintes surpreendentes. A cozinha, por exemplo, era a mais luxuosa jamais encontrada  em qualquer jornal do mundo, em alumínio brilhante. Havia salões com colunas de madeiras exóticas, um jardim de inverno no quarto andar. A sala de José Eduardo  abrigava um busto do próprio dono e, entre outras extravagãncias , uma mesa negra em S, de ônix, feita especialmente para o "senador". Em contrapartida o equipamento era extremamente precário, pois os homens do Diário Carioca nunca se haviam preocupado em investir nessa área. Não havia no  prédio nenhum vestígio de laboratório fotográfico. As impressoras estavam desgastadas  e eram insuficientes para imprimir sem sobressaltos um jornal moderno. Essas evid~encias eram compensadas pelo brilho de redatores, que escreviam com malícia e ironia, características que fizeram do Diário carioca um dos grandes renovadores da linguagem da imprensa brasileira.

Apesar disso, estava com a saúde financeira abalada, conforme revelou-se José Jobim naquele almoço no Jockey. A empresa devia bastante dinheiro ao Banco do Brasil, as máquinas estavam hipotecadas à caixa Econômica Federal. E Horácio de Carvalho, que àquela época dirigia de fato a imprensa, mostrava-se decidido a vendê-la. Decidi procurá-lo. Ele me informou que queria passar adiante a parte gráfica, mas não o jornal. Sem o jornal, sabia Horácio, a importância social do grupo seria nenhuma. Expliquei-lhe que o que me interessava era justamente a gráfica.  Ele me propôs que assumisse as dívidas do jornal  com o Banco do Brasil e a caixa Econômica. Eram quantias consideráveis, mas aceitei. Alpem disso, eu teria de pagar-lhe outra quantia em dinheiro e comprometer-me a imprimir o Diário carioca, gratuitamente, durante dois anos.

De imediato eu deveria conseguir 30.000 cruzeiros para assumir o controle da empresa que controlava a gráfica. O nome da empresa, Érica, ficaria famoso nos anos seguintes, durante a capanha com a qual meus adversários tentaram destituir-me.

Só então fui ao encontro de Alzira vargas, para relatar meus planos com relação ao jornal e também o teor da conversa que tivera com Horácio de carvalho. A filha de Getúlio aprovou inteiramente a ideia de criar um jornal, mas deixou claro que eu deveria encontrar os recursos sozinho.

- Se você conseguir, pode fazer - resumiu Alzirinha.

Saí em busca de três pessoas que me emprestássem 10.000 cruzeiros cada uma, subscrevendo cotas de ações da Érica. Não tardei em encontrar financiadores. O primeiro deles foi walter Moreira Salles, então um jovem banqueiro em franca ascenssão, que emprestara bastante dinheiro ao Diário carioca e tinha interesse na recuperação da empresa. Depois, entendi-me com Euvaldo Lodi, um poderoso empresário paulista sempre ligado `cúpula da Federação das Indústrias, que ambicionava candidatar-se à sucessão de Getúlio. O terceiro foi Ricardo Jafet, então empresário do banco do Brasil.

Lodi e Moreira Salles, cautelosos, subscreveram as ações, mas logo a repassaram a terceiros, para evitar complicações futuras. Jafet também adotou tais cuidados, mas cometeu um escorregão que mais tarde criaria graves problemas tanto para mim quanto para ele próprio. Em vez de entregar-me diretamente 10.000 cruzeiros, Jafet mandou que o Banco Cruzeiro do Sul, pertencente á sua família, me emprestasse o dinheiro. Em seguida, redescontou esse título no banco do Brasil e devolveu a quantia ao Cruzeiro do Sul. O futuro mostraria que se tratara de uma manobra irremediávelmente infeliz.

Obtidos os 30.000 cruzeiros, fechei o negócio com o Diário Carioca. Eu já tinha uma oficina, mas ainda me faltavam recursos para fazer um jornal. Só agora, nestas memórias, faço uma revelação que mantive em segredo durante toda a minha vida. Obtive a maior parte desses recursos junto a um homem que começava a crescer na cena política brasileira: Juscelino Kubstchek.                             
                       
[pg 131]

Procurei Juscelino a conselho do jornalista Carlos Medeiros de Lima, um antoigo integrante do Partido Comunista, que mais tarde se tornaria biógrafo de Tristão de Athayde. Medeiros era muito bem relacionado em Minas gerais, e me acompanhou no encontro com JK em Belo Horizonte. (...)

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